Chaveamento do Sinal de Áudio

A grande maioria dos pedais de efeito compartilha uma característica em comum: possuem uma chave “bypass”, que é responsável por acionar ou desligar o efeito. Quando esta chave é acionada, o sinal de entrada passa pelo circuito do efeito, e quando não acionada, o sinal da entrada vai diretamente para a saída, sem sofrer nenhuma modificação. É claro que esta explicação da chave “bypass” está extremamente simplificada. Muitos pedais de efeito contam com buffers de corrente na entrada e saída, e o sinal presente na entrada desses pedais passam por estes circuitos, independente do acionamento ou não da chave “bypass”. Outros circuitos colocam o sinal de entrada em paralelo com o sinal que passa pelo circuito do efeito. Porém, para o entendimento deste artigo, basta compreender o seguinte: se a chave “bypass” estiver ligada, o sinal da saída do pedal foi modificado pelo circuito do efeito; se a chave “bypass” estiver desligada, o sinal de saída é idêntico ao da entrada.

Chaveamento Mecânico vs. Chaveamento Eletrônico

Podemos dividir as chaves “bypass” de pedais em dois grandes grupos: chaveamento mecânico e chaveamento eletrônico.

No caso de chaveamento mecânico, o sinal de áudio passa pela chave. Este método é antiquado, porém muitos construtores DIY de pedais de efeito ainda o utiliza, devido ao fato de simplificar o circuito, eliminando alguns componentes ativos. Porém estes circuitos deixam muito a desejar em relação a qualidade de som, pois levar o sinal de áudio até a chave e o próprio chaveamento mecânico introduzem ruídos e zumbidos ao sinal. Sempre que um contato mecânico é acionado, ele não passa imediatamente de infinitos ohms de resistência para zero ohms (é claro que “infinitos ohms” e “zero ohms” são hipotéticos, colocados aqui somente para análise e descrição do fenômeno do chaveamento). Porém o que acontece é que, durante um curtíssimo período de tempo, enquanto os contatos mecânicos da chave estão se unindo, vários fatores, como a diferença de resistência pela superfície dos contatos, umidade, temperatura, entre outros, fazem com que um ruído seja acrescentado ao sinal. Isto é particularmente ruim no caso de pedais de efeito, em que são chaveados sinais ínfimos, da ordem de centenas de milivolts, e onde o ruído de uma chave pode facilmente se sobrepor ao sinal.

No caso de chaveamento de sinal DC podemos utilizar um circuito de “debouncing” que elimina o ruído do chaveamento, porém no caso de chaveamento de sinal AC, como é o sinal de um captador de guitarra, não existe forma de eliminar o ruído do chaveamento. Portanto, sempre que for utilizada uma chave mecânica para fazer o chaveamento do sinal de áudio, será introduzido ruído a esse sinal.

No caso do chaveamento eletrônico, o sinal de áudio não passa pela chave “bypass”. Esta é a primeira vantagem desse tipo de circuito.

Se o sinal não sai da placa de circuito impresso para ir até a chave, temos uma redução enorme no ruído induzido neste sinal. A chave “bypass” no circuito de chaveamento eletrônico é responsável somente pelo chaveamento de um sinal DC. Este sinal passa então por um circuito de “debouncing”, formado geralmente por um resistor e um capacitor, o que elimina todo o ruído produzido na chave. Este sinal DC então é aplicado a algum dispositivo eletrônico de chaveamento analógico.

Chaveamento Mecânico

Abaixo são descritos alguns exemplos de chaveamento mecânico de sinais analógicos, utilizando chaves SPDT, DPDT e 3PDT.

Chaveamento com SPDT

Este circuito, além de apresentar todas as desvantagens já discutidas do chaveamento mecânico, apresentam também a desvantagem de não ser “true bypass”.

Trata-se de uma chave reversora simples. Quando a chave estiver na posição “A”, o sinal que estiver presente na entrada, como por exemplo o sinal de uma guitarra, passará pelo circuito do efeito e irá para a saída. Para desligarmos o efeito, mudamos a chave para a posição “B”, e o sinal que estiver presenta na entrada será TODO direcionado para a saída. Correto? Infelizmente não. Devido a esta configuração, uma parte do sinal irá para a saída, porém como a saída do circuito de efeito nunca é desligada, parte do sinal é perdido sobre a resistência de saída do circuito de efeito, como mostrado na figura abaixo.

Como raramente encontramos chaves SPDT no mercado, a configuração do chaveamento com SPDT somente será utilizada em circuitos onde não se deseja muitos fios na chave, ou onde utilizaremos a segunda seção da chave DPDT para acionarmos o LED piloto, que é o LED que indica se o efeito está ligado ou não.

Chaveamento com DPDT

A segunda forma de chaveamento mecânico é a que utiliza uma chave DPDT. As duas seções da chave são utilizadas para o sinal de áudio. Todas as desvantagens apontadas neste artigo em relação à utilização de dispositivos mecânicos para o chaveamento do sinal de áudio ainda estão presentes: o cabeamento levando o sinal de áudio entre a placa de circuito impresso e a chave induzirão ruídos, bem como o ruído do acionamento da chave será acrescentado ao sinal. Porém este circuito apresenta uma vantagem em relação ao circuito que utiliza uma SPDT: trata-se de chaveamento “true bypass”. O que isto significa? É que, quando o circuito não estiver acionado, todo o sinal presente na entrada será transferido para a saída, sem perda nenhuma, pois tanto a entrada quanto a saída do circuito de efeito são desconectados.

Chaveamento com 3PDT

E se quisermos adicionar a este circuito um LED para sinalizar o acionamento da chave “bypass”? Como utilizamos as duas seções da chave DPDT, não sobre mais nenhuma para ligarmos o LED de sinalização. A primeira solução para o problema é utilizarmos uma chave com mais seções. Uma chave 3PDT pode ser utilizada: teríamos 2 seções fazendo o chaveamento “true bypass”, enquanto uma seção ligaria e desligaria o LED piloto. O problema em relação a esta solução está no preço da chave 3PDT, que custa mais que uma chave DPDT.

Chaveamento Eletrônico

Como já foi mostrado no começo do artigo, a principal diferença entre o chaveamento mecânico e o eletrônico é que no primeiro o sinal de áudio passa pela chave “bypass”, enquanto que no segundo, a chave “bypass” faz o chaveamento de um sinal DC. Este sinal é aplicado a uma chave analógica, e esta chave analógica “liga” ou “desliga” o sinal de áudio, sem acrescentar nenhum ruído.

Chave Analógica

Uma chave analógica é um dispositivo eletrônico capaz de chavear um sinal analógico a partir de um sinal digital. Por exemplo, se o sinal digital estiver em ‘1’, a chave analógica deixa passar o sinal analógico, porém nenhum sinal analógico passa se o sinal digital estiver em ‘0’.

Existem duas implementações básicas de chaves analógicas para sinais de áudio: a primeira utiliza JFETs, a segunda utiliza circuitos integrados.

A implementação acima é a que é utilizada na imensa maioria dos circuitos de pedais comerciais de qualidade (Boss, DOD, Ibanez, etc.). Utiliza um JFET canal N de baixa potência. Os terminais Source(Fonte) e Drain(dreno) são polarizados com uma tensão em torno de 4,5 V, isto é, a metade da tensão de alimentação dos pedais, já que utilizam baterias de 9 V. Quando aplicamos o sinal digital de controle de 0 V, o FET não conduz, e comporta-se como uma chave aberta. Quando a tensão for acima da tensão de polarização – geralmente aplicamos os 9 V da fonte de alimentação –, o transistor comporta-se como uma chave fechada, permitindo a passagem do sinal analógico da entrada para a saída. Na realidade, quando o transistor está conduzindo ele comporta-se mais como um resistor de baixo valor, aproximadamente 100 ohms. Comparado com o valor de outros resistores num circuito de pedal, este valor é desprezível.

O segundo tipo de chave analógica é implementada dentro de integrados. Os integrados CD4016 e CD4066 são exemplos de chaves analógicas integradas. Cada um destes integrados possui 4 chaves analógicas independentes. A diferença entre os dois é que a resistência da chave ligada é muito menor no CD4066.

A utilização de cada uma destas chaves é muito simples. Cada uma possui dois terminais de entrada/ saída. Cada um destes terminais pode ser utilizado tanto como entrada como saída de sinal. Possuem também um terminal de controle. Quando este terminal estiver em ‘0’(0 V), nenhum sinal passa pela chave. Quando o sinal estiver em ‘1’ (+VCC, ou no caso de pedais de efeito, 9 V), o sinal passa pela chave.

As chaves analógicas integradas são mais baratas, possuem menor resistência ôhmica quando ligadas e não necessitam de resistores externos de polarização para funcionar. Então, sempre utilizaremos chaves analógicas integradas nos projetos do site? A resposta é não. Apesar de todas as vantagens das chaves analógicas integradas, as chaves analógicas implementadas com JFETS possuem a vantagem de chavear o sinal analógico onde ele estiver localizado no circuito impresso; isto é, o sinal digital de controle da chave analógica é que percorre a placa de circuito impresso, e mantemos o percurso do sinal analógico o mais curto possível, evitando aumentar a possibilidade de indução de ruído. Isso não invalida a utilização de chaves analógicas integradas, que também podem ser utilizadas. Outra desvantagem da utilização de chaves analógicas integradas é que o circuito integrado necessita alimentação para funcionar. Esta é só uma pequena desvantagem, pois os circuitos CMOS consomem muita pouca corrente. Mas, de qualquer forma, são pelo menos duas trilhas a mais no circuito impresso a serem roteadas.

Como é Gerado o Sinal de Controle?

Já foi mostrado como o sinal analógico é chaveado utilizando chaves analógicas, porém estas chaves necessitam de um sinal de controle digital: ‘1’ para deixar passar o sinal e ‘0’ para bloqueá-lo.

Pedais comerciais não costumam utilizar chaves SPDT, DPDT ou 3PDT. Utilizam uma chave de fechamento momentâneo, tipo “push-button”, e um circuito eletrônico, para “travar” o sinal digital em ‘1’ quando o usuário aciona a chave “bypass” e retorna o sinal a ‘0’ quanto o usuário aciona novamente o pedal.

O circuito gerador do sinal de controle é geralmente um “flip-flop” construído com transistores NPN. Os pedais Boss e Ibanez utilizam esta configuração. Enquanto o ponto “A” estiver em “1” o ponto “B” estará em ‘0’ e vice-versa.

Em pedais como o DOD o acionamento é feito através de um circuito com o integrado CMOS CD4007.

A utilização destes circuitos acrescenta uma dificuldade na utilização de uma pedaleira. Imagine que sempre que ligamos a alimentação da pedaleira todos os pedais estão com o efeito desligado. Isto é, todos os pedais apresentam em suas saídas o mesmo sinal da entrada. Imagine uma pedaleira com 7 pedais, dos quais 3 ou 4 sempre devem estar com os efeitos ligados. Sempre que ligarmos a pedaleira teremos que acionar estes 3 ou 4 pedais. Este problema não acontece se, ao invés dos dispositivos eletrônicos para a geração do sinal de controle, utilizarmos uma chave com trava, como as DPDT.

Utilizar uma chave DPDT para gerar o sinal de controle tem a vantagem de eliminar vários componentes eletrônicos da placa do circuito de efeito e, manter travado o estado do pedal, com o efeito ligado ou desligado, mesmo se desligarmos a tomada de alimentação do pedal. Esta solução é adotada no acionamento de efeitos de amplificadores como os Fender, por exemplo. Com a substituição do circuito “flip-flop” pela chave DPDT, conseguimos eliminar componentes de um circuito sem afetar em nada sua qualidade sonora e, mais ainda, uma funcionalidade a mais é incluída no pedal.

O desenho acima é uma simplificação deste tipo de circuito, mas exemplifica muito bem como o sinal digital pode ser gerado: se a chave estiver na posição “A”, teremos A=’1′ e B=’0′, e se a chave estiver na posição “B”, teremos A=’0′ e B=’1′. Estes sinais podem então serem aplicados nas chaves analógicas para fazer o acionamento do sinal analógico do pedal. O mesmo sinal também pode ser aplicado no acionamento do LED indicativo.

Conclusão

Foram demonstrados os tipos de circuito mais comumente utilizados no chaveamento de sinais em pedais de efeito, suas vantagens e desvantagens. Nos circuitos do site serão encontrados o chaveamento DPDT gerando um sinal digital, aplicado a JFETs funcionando como chaves analógicas, salvo algumas exceções, como eventualmente, a utilização de chaves analógicas integradas ou a utilização de chaves DPDT chaveando diretamente sinais analógicos. Porém, nestes casos estas configurações serão utilizadas ou para simplificar determinado circuito ou com propósitos didáticos.

Este artigo obviamente não encerra a discussão sobre este assunto, que poderá ser abordado novamente se necessário.